sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

125 7th Street revisited

Havia chegado tarde do trabalho. Jogou a mala sobre o sofá e as roupas por todo o chão do apartamento. Seminu, trajando apenas uma bermuda e chinelos, foi até a varanda e sentou-se em sua cadeira que comprara em Maceió. Do maço surrado de Marlboro, tirou um cigarro que foi logo acendendo. Da sala, podia-se ouvir, ao fundo, a melodia de The killing moon.
Sentado, observava silhuetas dos edifícios ao redor: todos iguais e gêmeos pela ausência de doçura. Gostava dessas doçuras da vida: brownies, Via Láctea, preguiça matutina, e fantasiava um mundo repleto dessas doçuras que nunca se encerram em si. Porém, entre ele e as silhuetas havia um poço de estacionamentos e playgrounds envoltos num breu silencioso. Puxou para si a luneta que ganhara quando criança e percorreu as luzes penduradas nos condomínios ao redor. Via-se casais dormindo profundamente, adolescentes em computadores, solteiros preparando o jantar.
Foi num transporte de olhar inesperado, que, numa outra varanda, surgiu um vulto abraçado aos joelhos. Ouvia-se através do breu silencioso uma respiração opressa, um soluço.
A dor é um encantamento que os tomou num transe: ela, pesada e irreversível; ele, curioso e irrecuperável. Ficaram unidos nesse tempo indissolúvel, parados, num abraço-olhar. Por detrás das retinas tão agudas dele, enquadrava-se o sofrimento tão dela, tão egoísta.
Acima, em meio às nuvens, a lua andarilhava meio-escapista acorrentando os personagens numa passarela curiosidade-sofrimento. Ele queria fazer a travessia de toda aquela escuridão e acalentá-la num abraço, mas ela repugnava os homens, as mulheres e crianças e animais. Na repulsa por tudo que era vivo, soergueu sua cabeça, e por detrás das palmas manchadas pela maquiagem, avistou um curioso que encarnava o solidário e o repreensivo. Notou-se tão nua e indefesa que só lhe sobrou forças para correr para dentro de seu apartamento.
Do outro lado desse mesmo abismo, ele sentiu tamanha vergonha de sua curiosidade que não pôde terminar seu cigarro.

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